
Há pessoas que vivem a vida intensamente e a abraçam de tal maneira que não morrem. Apenas partem. Como quem vai ali, para uma viagem. Pepe Mujica se foi e não volta, mas sua trajetória é tão marcante, suas lições de tal grandeza, que ficaremos por anos a fio nos lembrando de suas frases e ensinamentos.
Pepe nos ensinou com os seus atos, com o seu modo de vida. Falava em simplicidade, mas vivia com simplicidade. Ou seja, demonstrava na prática o que era se deslocar em um fusca azul, do ano de 1987, que o levava ao centro da cidade de Montevidéu, com a mesma eficiência de qualquer SUV. Não tinha pressa e, portanto, desde que chegasse e cumprisse a sua agenda, pouco importava se a pintura azul calcinha era ou não reluzente e moderna. Era eficiente, e isto bastava.
Amava a natureza, o seu cachorro e a sua companheira de luta, de vida, de caminhada, Lucía Topolanski. Gostava de se voltar aos jovens, uma preocupação constante, como se a acalmá-los e a dizer-lhes que devagar também é pressa. Que parassem para olhar em volta, antes de se jogarem em desabalada carreira rumo ao futuro. Era como se Pepe lhes puxasse pela roupa e lhes perguntasse: “Hei! Onde vão com tanta pressa? Calma, olhem ao redor!”. Ele se dizia um “panteísta”, amante da natureza.
Logo ele, que se jogou cedo pelos caminhos do ideal revolucionário, pagando o preço pela opção pelos pobres, pela redução das desigualdades, ainda que fosse pelos meios tortos da desapropriação dos bancos, de onde o dinheiro só sairia e seria dividido pelos seus métodos, pouco ortodoxos. Acreditou na luta. Mofou em solitárias – quem assistiu ao filme “Uma noite de 12 anos, custa a crer que saiu vivo, e confiante, e com a mesma gana de luta, desta vez por outros métodos, mais brandos.
Encontrou o caminho da política tradicional e a praticou com a paciência que não teve na juventude, mas que o aprendizado na solidão do fundo de uma cela forjaram. Enquanto não sabia se sairia vivo de lá, repassava mentalmente os livros que havia lido – uma vez contou -, e assim manteve a sensibilidade, a emoção modulada e a cabeça em dia, enquanto o corpo era posto à prova. E, talvez, de todo aquele sofrimento que lhe foi imposto, as consequências se fizeram notar tardiamente, mas apresentando uma conta para ser paga quase à vista. Pepe Mujica descobriu a doença em avançado estágio. Corajoso, fez a opção por tratamentos menos radicais, que lhe permitissem apagar lentamente, como uma vela que iluminou o seu povo com sabedoria e aos poucos se apagou.
Na última declaração, demonstrou certa impaciência com a certeza do fim, que sabia próximo, mas que não podia abreviar. Não era católico, mas tinha fé na vida e na forma que ela encontra para fazer desaparecer esse ou aquele. Esperou a sua vez estoicamente.
Foi em abril de 2024 que Mujica anunciou o diagnóstico de câncer de esôfago, em uma entrevista coletiva, pouco depois de uma conversa longa e linda, com a companheira jornalista do 247, Marcia Carmo. Afastado àquela altura, da política, contou na coletiva que descobriu o tumor em um exame de rotina, e que sua saúde ficou "muito comprometida". O ex-presidente sofria também de Síndrome de Strauss, uma doença imunológica crônica.
Não parecia temer a morte. Chegou a verbalizar o tipo de relação que tinha com ela: "É preciso morrer. Pertencemos ao mundo dos vivos, nascemos destinados a morrer. Por isso a vida é uma aventura maravilhosa. Mais de uma vez na minha vida a morte rondou a minha cama, desta vez parece que vem com a foice em punho. Vamos ver o que acontece", afirmou.
Ex-presidente mantinha discurso otimista e incentivava a juventude. "Vou continuar militando com meus companheiros, fiel à minha forma de pensar, com minhas verduras e com minhas galinhas. Quero dizer às meninas e aos meninos do nosso país que a vida é linda, mas se desgasta. A questão é recomeçar a cada vez que cair e, se houver raiva, transformá-la em esperança", ensinou, após o anúncio da doença.
Foi representante da esquerda latino-americana e defensor de uma agenda progressista. Além de presidente, Mujica foi deputado, senador e ministro da Agricultura. Ele se aposentou definitivamente da vida política em 2020, quando renunciou ao cargo de senador por problemas de saúde. Pepe Mujica foi acima de tudo um homem coerente. Amava o seu povo e era amado por ele. Pepe se vai, nesse dia 13, mas sua história fica.
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(msn)